Como afastar os Jovens das drogas
O crack invadiu a classe média. Uma pesquisa inédita mostra que as
famílias não sabem onde obter ajuda. Confira a seguir um trecho dessa reportagem que pode ser lida na íntegra na
edição da revista Época de 12/junho/2010.
DEGRADAÇÃO
A montagem sobre a foto de
um modelo simula os efeitos de alguns anos de uso de drogas
Foram quatro anos sob os efeitos de maconha, cocaína, ácido lisérgico,
ecstasy, crack e até chá de fita cassete – uma “droga” a que os dependentes
recorrem para suportar crises de abstinência. A triste viagem de Renan começou
na casa da família, num bairro de classe média em São Paulo, e o levou ATÉ a
favela Paraisópolis, a segunda maior da capital paulista.
“Lá eu estava onde eu queria, com a galera, e me drogava direto”, diz. Seus
pais, Alda e Eli, haviam tentado impor limites para afastá-lo da dependência.
Primeiro, conversaram. Depois, proibiram o filho de usar o carro, cortaram a
mesada, estabeleceram horário para que ele chegasse em casa. Eles não eram
novatos no assunto. Antes de Renan, o caçula da família Larizzatti, outros dois
filhos do casal haviam passado por problemas semelhantes. “Com três filhos
usando drogas, vi que era o fundo do poço”, diz Alda. O casal decidiu internar o
mais novo, então com 22 anos. Antes de ser levado para uma clínica de
desintoxicação, Renan fez uma ameaça aos pais: “Quando sair, eu mato vocês”.
Três anos e dois meses depois do último contato com as drogas, Renan ajuda a
família na casa lotérica que os sustenta. “Hoje, se eu matar meus pais, só se
for de amor”, afirma.
Histórias como a dos Larizzattis ocorrem em muitas famílias. Às vezes, porém,
o desfecho é trágico. Em 2009, a consultora aposentada Flávia Costa Hahn, de 60
anos, moradora de um bairro nobre de Porto Alegre, matou seu único filho, Tobias
Hahn, de 24 anos. O rapaz consumia crack desde os 18 anos. Em abril do ano
passado, depois de passar três noites em claro fumando crack, Tobias voltou para
casa para pedir dinheiro. Flávia conta que discutiu com o filho, foi agredida e,
para tentar se defender, pegou um revólver da coleção de armas do marido. A arma
disparou e atingiu Tobias no pescoço. Ele morreu na hora. Em outro caso
dramático, o músico Bruno Kligierman, de 26 anos, um jovem de classe média alta
morador da Zona Sul do Rio de Janeiro, sufocou até a morte a amiga Bárbara
Calazans, de 16. Ele havia consumido crack a noite toda. Seu pai, o poeta Luiz
Fernando Prôa, o entregou à polícia.
Para dependentes de drogas, raramente há uma saída fácil. Internar o filho
drogado, como fizeram os pais de Renan, é um recurso extremo, que até pouco
tempo atrás era definido como exagerado. Para os Larizzattis, a decisão provou
ser correta. Não só porque ele venceu a dependência. “Os pais de hoje têm medo
de agir, estabelecer regras ou proibir”, afirma Luiz Fernando Cauduro,
vice-presidente da ONG Amor Exigente, que ajuda famílias nessa situação. “Esse
medo tem de ser rompido. Ele leva a família a não tomar uma atitude – e isso
pode tornar o caso crônico.”
Medidas exageradas podem levar o usuário de
drogas a ficar mais tempo nesse universo
Mas o que fazer quando mesmo uma atitude mais dura da família não basta? Em
2005, a funcionária pública Sônia (
nome fictício) descobriu que seu
filho mais novo, então com 13 anos, era usuário de drogas. Sônia, o marido e
outros dois filhos viviam num condomínio de classe média alta no interior
paulista. O caçula havia começado a fumar maconha aos 11 anos, com amigos. Seu
rendimento escolar despencou, ele trocou de amizades e se distanciou dos irmãos.
“Achei que era um problema da idade, da adolescência”, diz Sônia. “Só percebi
que eram as drogas quando antigos amigos dele me falaram que ele estava andando
com uma turma barra-pesada.” Sônia procurou ajuda onde pôde. “Pesquisei na
internet, em serviços públicos, paguei psicólogos, terapias, até a igreja eu
procurei”, diz. A família decidiu tirar o filho da escola para distanciá-lo das
amizades e vigiá-lo de perto. Ficava sob os cuidados do pai, vendedor de joias,
que o levava até nas viagens de negócios. Em 2007, Sônia internou o filho em uma
clínica para dependentes ligada a religiosos. O tratamento era baseado mais em
ações espirituais do que terapêuticas, e não teve resultado. “Foi um tiro no pé,
havia gente mais velha, e ali ele aprendeu tudo sobre as drogas.” Sônia decidiu
então mudar de cidade. “Queria afastá-lo de tudo o que havia acontecido.” No
começo, a estratégia deu certo: o filho passou um ano sem se drogar, começou a
trabalhar em um pet shop e pensava em voltar a estudar. Mas houve uma recaída.
Hoje, aos 17 anos, o caçula de Sônia está internado. Pela segunda vez, ele tenta
largar o vício.
Os resultados distintos das experiências de Sônia e da família Larizzatti no
combate às drogas mostram que não existe um método infalível. A internação numa
clínica só deve ser considerada quando outras abordagens falham. “Os pais devem
saber conversar com os filhos”, diz a psicóloga Lulli Milman, da Universidade
Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), autora do livro
Cresceram!!!: um guia
para pais de adolescentes (Editora Nova Fronteira). “Quando descobrem que o
filho fumou maconha na festa de sábado, alguns pais amplificam a questão e
tratam o garoto como se fosse um traficante”, diz. Para ela, uma medida
exagerada pode levar o filho a ficar por muito mais tempo no universo das
drogas. Rejeitado em casa, ele pode buscar lugares onde seja mais aceito – ainda
que esses locais coloquem sua vida em risco. “Pais que adotam esse discurso
dogmático, sem muita relação com a realidade, tendem a se afastar dos filhos e
ficar desacreditados por eles”, diz Lulli.
“A maior parte das pessoas faz uso consciente de drogas ilícitas da mesma
forma que muitas pessoas usam álcool”, diz o antropólogo Edward MacRae, que
também é pesquisador do Centro de Estudos e Terapia do Abuso de Drogas da
Universidade Federal da Bahia (UFBA). “Eu frequento lugares em que vão jovens.
Vejo que usam maconha, e isso não afeta seu desempenho de forma tão perceptível
como ocorre com o álcool.” Nem todo usuário esporádico, porém, é capaz de abrir
mão do consumo quando bem entender. “O uso recreacional é como uma
roleta-russa”, diz Ruben Baler, pesquisador do Instituto Nacional sobre Abuso de
Drogas (Nida, na sigla em inglês), dos Estados Unidos. Para ele, é impossível
saber de antemão se alguém se tornará dependente ou não. O uso de drogas como
válvula de escape aumenta na proporção da incapacidade dos jovens de aceitar a
frustração. Mas muitos usuários não percebem quanto a droga se tornou parte de
sua rotina até que tenham se tornado dependentes.
Quando lemos reportagens como essa ,a primeira coisa que nós perguntamos é.porque,qual motivo a vida de um jovem chegou a esse ponto? Esta na hora das Familias assumirem o seu papel e tomar conta dos seus filhos e filhas pois a resposta que mais teremos nessa pergunta, é a ausencia da Familia.